25 fevereiro 2011

A novela da UESPI em Picos


A situação do campus da UESPI de Picos é realmente estarrecedora e
parece ter raízes históricas, a começar pelo local.

Por João Benvindo de Moura - 24/02/2011

A situação do campus da UESPI de Picos é realmente estarrecedora e
parece ter raízes históricas, a começar pelo local de instalação do
mesmo na década de 1990 em espaço onde funcionava o antigo Campus
Avançado da Universidade Federal de Goiás cuja principal atividade era o
Projeto Rondon. Tratava-se de um terreno de, aproximadamente, vinte mil
metros quadrados localizado no bairro Junco, onde havia uma sede
administrativa, quadras de esporte, laboratórios e uma imensa área verde
com árvores frondosas.

Quando da minha gestão na presidência da Associação de Moradores do
Bairro Junco, no período de 1991 a 1993, apresentei vários projetos à
Prefeitura de Picos e ao governo do estado, no sentido de transformar
aquela área num Parque Municipal com trilhas, praças, lagos, espaços
para práticas de esporte etc. Seria um investimento pequeno tendo em
vista que grande parte da infra-estrutura já estava pronta e a área
verde já existia. Picos passaria a ter, assim, um espaço ecológico para
descanso e lazer, destoando um pouco da lama e da poeira tão
características, infelizmente, da nossa cidade.

Inesperadamente e de forma irracional, esse espaço passou a ser
"loteado" a partir de 1993 para abrigar algumas obras e serviços do
estado. Centenas de árvores robustas foram derrubadas para dar lugar a
prédios públicos que poderiam ser construídos em diversos outros locais.
Primeiro, a construção da CEASA. Depois, a construção de um posto do
DETRAN. Em seguida, um ginásio poliesportivo cuja obra foi superfaturada
e embargada logo depois e, por último, um campus da UESPI com seis
cursos e seis salas de aula, uma verdadeira aberração seja do ponto de
vista administrativo ou pedagógico.

Quase o mesmo destino teve o Campus da UFPI. Construído no início da
década de 1990 dentro de um riacho, num terreno pantanoso, bem próximo
de onde, mais tarde, seria edificado o campus da UESPI. Quando comecei a
fazer faculdade, em 1993, precisávamos tirar o tênis e arregaçar as
calças para transpor uns quinhentos metros de pura lama. Ainda tenho
fotos e vídeos dessa aventura (para não chamar de descaso). A sorte do
campus da Federal é que, nos últimos 8 anos, o governo Lula derramou
dinheiro a balde para expansão das Instituições Federais de Ensino
Superior. Tanto para o aumento da quantidade de cursos, quanto para
ampliação das instalações. Milhões de reais, portanto, já foram
enterrados dentro da lagoa da UFPI para aterro, drenagem e desvio do
curso das águas. Daria para construir um prédio de 10 andares em outro
local. Em Teresina, o reitor da UFPI construiu dezenas de quebra-molas e
um portal na entrada do campus para conseguir gastar o dinheiro todo.

O poder público alega a ausência de espaço urbano para sediar os prédios
públicos. O IFET foi parar no Pantanal. O incrível é que a Igreja
Universal instalou-se facilmente em plena Praça Félix Pachêco, ocupando
um espaço onde outrora funcionava o cinema da cidade. O grupo Carvalho
parece não ter tido tanta dificuldade para construir seu supermercado em
frente à rodoviária. Pascoal Silva não demorou a encontrar espaço para
construir um posto de gasolina, hotel e ampla área de estacionamento em
frente ao DNIT. É bem verdade que os terrenos mais próximos do centro
custam bem mais caro. Mas será que o nosso povo não merece serviços
públicos eficientes e mais próximos de onde moram? E quem disse que os
terrenos doados ou adquiridos em locais inadequados representam economia
para os cofres públicos. O campus da UFPI que o diga.

Voltando à UESPI, o prédio inicial não possuía estrutura para abrigar
sequer uma creche, mas nele foi instalado, com pomposa festa, um campus
universitário. E a cada vinda de Mão Santa a Picos era assinada uma
autorização para criação de um novo curso. Não demorou muito para todos
perceberem o óbvio: o espaço era insuficiente para acomodar a quantidade
de alunos. Eis que a sábia equipe do governo do Piauí resolveu reformar
um prédio abandonado no cafundó do Judas onde antes funcionava o SESI
para servir de novo campus da UESPI. Região desabitada, fora da zona
urbana da cidade em meio ao escuro e ao desolamento. De animador mesmo,
só havia um motel em frente. Para lá foram "banidos" os cursos tidos
pelo governo como de "terceira categoria?, ficando os cursos da elite,
obviamente, mais próximos da civilização.

A UESPI era, no governo de Mão Santa, uma fábrica de fazer voto. Com
mais de dois mil professores, apenas 100 eram efetivos, os outros eram
"temporários?. Um verdadeiro cabide de emprego. E quem não lembra dos
escândalos do curso de medicina. Os filhos da elite faziam vestibulares
em universidades privadas pelo Brasil afora e logo em seguida "ganhavam?
a transferência para a UESPI. Entravam 40 alunos para o Curso de Direito
pelo Vestibular e na formatura havia 120 concludentes. Era o milagre da
multiplicação, em todos os sentidos! Não havia dotação orçamentária para
dar suporte à UESPI e os alunos pagavam taxas e mensalidades exorbitantes.

Entra o governo do PT em 2003. A turma de dinossauros começa a se
aproximar de Wellington. Era a velha estratégia: "Quando não se consegue
vencer o inimigo, junte-se a ele?. Jônathas recebe de presente a
Superintendência de Ciência e Tecnologia. Fernando Monteiro, a
Secretaria de Defesa Civil. Warton, o eterno suporte de Zé Néri, vira
líder do governo (quem diria!!!) e Kleber, que entrou na Assembleia
junto com a Proclamação da República, passa a ser o Conselheiro-mor do
governador. Aliás, um grande amigo me fez outro dia uma afirmação
pitoresca: "Wellington Dias realizou a incrível façanha de destruir e
ressuscitar as oligarquias do Piauí?. Pois bem, sabendo da bomba relógio
que era a UESPI, Kleber convence Wellington a "prestigiar? alguém do PT
com a direção da mesma e, sorrateiramente, sugere entregar o presente de
grego à Oneide Rocha. Era um plano muito bem bolado para aniquilar o PT
de Picos e abrir espaço para o PMDB na cidade. O PT engoliu a isca
direitinho.

Sem dotação orçamentária suficiente para gerir a Instituição, Oneide
passa a assumir aquele que seria o mais contraditório discurso de toda a
sua vida política: a manutenção da cobrança de taxas numa universidade
pública. Como não pertencia ao corpo docente da instituição, enfrentou
toda sorte de hostilidades até, finalmente, desgastada, entregar o
cargo. Havia se consolidado, no entanto, a eleição direta para reitor,
um marco histórico na trajetória da UESPI. Somente nos anos de 2003 e
2004 foram contratados, através de concurso público, 284 novos
professores efetivos para a universidade, além de imenso investimento na
qualificação dos mesmos e instituição de um plano de carreira, cujos
salários, em alguns casos, chegam a ser superiores ao dos professores da
UFPI. A área dos recursos humanos estava consolidada.

Diversos cursos com pouca procura foram cancelados, possibilitando um
investimento maior em outros setores. A UESPI parecia estar fazendo sua
lição de casa. O problema do campus de Picos, no entanto, aparece como o
mais gritante erro da gestão da UESPI nos últimos 20 anos. É inaceitável
que uma cidade do porte da nossa, com a segunda maior arrecadação de
impostos do estado, com o maior entroncamento rodoviário do Nordeste,
polo de uma microrregião com uma população de 500 mil habitantes, não
tenha um prédio digno onde possa funcionar a Universidade Estadual. Tal
fato revela a inércia de nossos representantes políticos e a pouca
atenção dada por sucessivos governos à nossa querida cidade modelo.

É preciso mobilização da sociedade picoense, encabeçada, sobretudo,
pelos servidores e alunos da UESPI, principais prejudicados com essa
situação. Se o povo egípcio conseguiu derrubar uma ditadura sanguinária
enraizada há 30 anos, certamente haveremos de derrubar a insensatez de
um governo que fecha os olhos para a educação de nosso povo.

** */*João Benvindo de Moura*//é professor do Departamento de Letras da
UFPI, campus de Teresina, e doutorando em Linguística pela UFMG. Foi
vereador de Picos pelo PT (mandato 2000-2004) e um dos fundadores do
Jornal Folha Picoense e da primeira rádio comunitária de Picos, a Junco
FM. É radialista e membro da União Picoense de Escritores - UPE. E-mail:
//jobenvindo@hotmail.com/ /? Blog:
//http://joaobenvindo.blogspot.com//